Ciro Oiticica (Agência Fiocruz
de Notícias)
A Fiocruz e a Iniciativa
Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi, na sigla em inglês Drugs
for Neglected Diseases initiative) firmaram, nesta terça-feira (29/3), um
Memorando de Entendimento para pesquisa e tratamento da dengue. A ocasião também
selou uma Aliança Estratégica de Pesquisa entre as duas instituições e a
submissão conjunta de um projeto ao Edital Finep para Doenças Negligenciadas.
Presidente da Fiocruz, Nísia
Trindade Lima recebeu, na Residência Oficial da Fiocruz (RJ), a comitiva
formada pelo diretor global de Pesquisa e Desenvolvimento da DNDi, Laurent
Fraisse; o presidente da iniciativa na América Latina, Michel Lotrowska; e o
diretor executivo regional da DNDi na América Latina, Sergio Sosa Estani, entre
outros representantes. A presidente enalteceu a cooperação histórica com a
DNDi, que se realiza desde sua criação, com um grande número de projetos em
comum. “A celebração não é apenas pelo Memorando de Entendimento, mas pela
consolidação de todo um percurso e o apontamento de caminhos de cooperação.
Formalizar essa aliança é importante porque nos permitirá pensar um plano
estratégico para o futuro, a respeito de doenças e populações negligenciadas,
como tem sido um enfoque adotado pela Fiocruz nessa estratégica parceria”,
destacou.
O diretor global de Pesquisa e
Desenvolvimento da DNDi, Laurent Fraisse, também celebrou os avanços. “Temos o
desejo de privilegiar nossos melhores parceiros. Com a Fiocruz, esse era o caso
antes, o é hoje, e o será para o futuro. Queremos trazer nossa energia para
contribuir com essa instituição de tanta capacidade, e elevar a parceria a um
nível estratégico”. Laurent lembrou as reuniões que teve mais cedo com os
vice-presidentes da Fiocruz Rodrigo Correa (Pesquisa e Coleções Biológicas) e
Marco Krieger (Produção e Inovação em Saúde), que também estiveram presentes na
Residência Oficial. “Tivemos conversas muito produtivas e dinâmica de manhã, a
respeito de doenças como a de Chagas, a leishmaniose. E avançamos em relação a
pesquisas para enfrentar a dengue, um novo projeto da DNDi”, contou.
A DNDi é uma organização sem
fins lucrativos de pesquisa e desenvolvimento e trabalha para oferecer novos
tratamentos para pacientes negligenciados. Desde sua criação, em 2003, ela
desenvolveu nove tratamentos para seis doenças negligenciadas. A organização
também está coordenando o ensaio clínico Anticov para encontrar tratamentos
para casos leves a moderados de Covid-19 na África. Como membro fundador da DNDi,
ao lado de instituições como o Instituto Pasteur e o Médicos Sem Fronteiras, a
Fiocruz tem assento nas instâncias da organização, representada pelos
pesquisadores Jorge Bermudez, membro no Conselho, e André Daher, no Comitê
Técnico.
Presente na reunião, Jorge
Bermudez acompanhou a evolução da organização desde o início. “Vejo um
progresso, saindo do modelo tradicional de Doenças Tropicais para envolver
também Hepatite C, Covid”, relata. Ele ainda destacou aspectos da parceria. “A
Fiocruz é uma instituição que tem atuação complementar em relação à DNDi e com
a qual é preciso se aliar na região da América Latina, pensando nas populações
negligenciadas e nas doenças que nos acometem atualmente. Entre elas, a dengue,
um problema crucial para região e o mundo como um todo”.
Memorando de Entendimento para
dengue
O projeto da DNDi sobre dengue
tem uma abordagem ampla, não estando centrada no desenvolvimento de um único
produto. Avaliam-se oportunidades de vacinas, medicamentos, diagnóstico, entre
outros. O Memorando de Entendimento ocorre no âmbito de uma parceria global de
pesquisa para encontrar tratamento para dengue, coordenada pela DNDi, e que
envolve instituições da Índia, Tailândia e Malásia. A organização também quer
incluir instituições de países africanos, como a República Democrática do Congo
e Gana, para realizar mais estudos epidemiológicos. A Fiocruz tem um papel
central nessa rede pela amplitude de suas atividades.
Globalmente, o número de casos
incidentes de dengue aumentou em 85% de 1990 a 2019. Prevê-se que o aumento das
temperaturas ligadas às mudanças climáticas torne ainda maior esse índice,
podendo alcançar 60% da população mundial até 2080. A busca de uma abordagem
ampla para o enfrentamento da dengue deve incluir também diagnóstico e vacinas.
O vice-presidente de Produção
e Inovação em Saúde, Marco Krieger, valorizou essa nova frente de atuação.
“Fazíamos a defesa dessa iniciativa antes mesmo da pandemia. Ela agrega a
projetos que já tivemos, como na doença de Chagas, leishmaniose e malária, uma
linha endêmica tematicamente importante para a região da América Latina”.
Aliança Estratégica
Uma Aliança Estratégica entre
DNDi e a Fiocruz também foi formalizada. Ela visa fortalecer o relacionamento
existente por meio do estabelecimento de um Comitê Estratégico Conjunto para
supervisionar todas as colaborações presentes e futuras, que se dão em
diferentes áreas de pesquisa e desenvolvimento, advocacy e programas de acesso
a múltiplas doenças infecciosas. Até 2028, as duas instituições esperam
contribuir para fortalecer as capacidades na região da América Latina e
garantir que medicamentos novos, eficazes, seguros e acessíveis sejam
desenvolvidos e entregues a pacientes negligenciados. Os próximos passos
envolvem a criação de um grupo de trabalho para desenvolver o processo, pela
definição da estrutura e governança, e a identificação de áreas potenciais, nos
âmbitos da pesquisa e desenvolvimento, pesquisa de implementação, produção em
Chagas, leishmaniose, HCV, dengue e HIV pediátrico.
Vice-presidente de Pesquisa e
Coleções Biológicas, Rodrigo Correa projetou a parceria, que terá, segundo ele,
muito a ganhar com a troca de informações e experiências. “Há, inclusive,
interesse da DNDi de utilizar a rede Fiocruz de biobancos”, contou. “Que
possamos ampliar cada vez essa parceria”. Jorge Mendonça, diretor do Instituto
de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz), por sua vez, revelou que há
a previsão, como fruto da parceria com a DNDi, de trazer para o Brasil um
tratamento de hepatite C. “O próximo passo é apresentar a documentação para a
[Agência Nacional de Vigilância Sanitária] Anvisa”. A aliança ainda
permitirá, segundo ele, incorporar de forma estratégica diagnóstico e
tratamentos: “a diminuição do tempo entre o diagnóstica e a chegada do
medicamento será muito importante para o sistema de saúde”.
Outra frente dessa aliança,
destacada por Sergio Sosa Estani, diretor executivo regional da DNDi na América
Latina, é a área de advocacy. “Para poder desenvolver planos de ação,
necessitamos de um ambiente de parceria”, explicou. Otimizar esse ambiente também
contempla a ação específica de advocacy, para nos aproximar de
atores-chave”.
Projetos para doenças
negligenciadas
A DNDi e a Fiocruz submeteram
projeto conjunto ao edital da Finep de fomento à pesquisa, desenvolvimento e
inovação em Doenças Negligenciadas, Tropicais e transmitidas por vetores e
outras doenças. O projeto Acelerando o desenvolvimento pré-clínico e
clínico de tratamentos para a dengue através do reposicionamento de
medicamentos tem como objetivo construir as bases pré-clínicas e translacionais
necessárias para o início da avaliação clínica de medicamentos reposicionados
de uso precoce, que previnam o surgimento e/ou reduzam a duração dos sintomas,
e evitem a progressão para a forma grave da doença.
Espera-se validar e selecionar
ao menos um candidato clínico (idealmente uma combinação de um agente antiviral
e um anti-inflamatório ou antiplaquetário) e preparar as etapas regulatórias
necessárias para submissão de estudo clínico de Fase II no Brasil visando o
desenvolvimento clínico e aprovação de um novo tratamento para dengue.
O projeto foi selecionado entre mais de cinquenta outros. Para estes, Krieger relatou que há o plano, como uma das primeiras ações da Aliança Estratégica, de elaborar uma chamada de forma conjunta com a DNDi. “Seria uma iniciativa adicional para tentar contemplar esses dois grandes núcleos, desenvolvimento de diagnósticos em doenças negligenciadas e avaliação de reposicionamento de fármacos”.
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